Dificuldades de aprendizagem: concepções que permeiam a prática de professores e orientadores
Dificuldades de aprendizagem: concepções que permeiam a prática de professores e orientadores
Profa. Dra. Cecília Iacoponi Hashimoto.
No ano de 1994, entrei para curso de Mestrado na PUC/SP com o objetivo de buscar respostas a uma inquietação que me acompanhava: Como professora alfabetizadora de alunos do primeiro ano do primeiro grau, naquela época não se falava em ensino fundamental, não compreendia o motivo de as escolas encaminharem tanto os alunos para os especialistas, se na maioria das vezes, o problema poderia ser solucionado na própria escola. Isso realmente me intrigava!
Já tinha feito a Pós em Psicopedagogia Clínico Institucional, mas ainda assim queria estudar mais a fundo essa temática.
Lancei um questionamento inicial para o trabalho: O que pode ser considerado comodificuldade de aprendizagem? , visto que o que buscava era a compreensão do que as pessoas – professores e orientadores – consideravam como dificuldade de aprendizagem.
Conduzi todo o trabalho em busca desta definição: o que cada um tem para si que é dificuldade de aprendizagem, o que significa, o que entende. Entrevistei professores e orientadores de escolas particulares e públicas. E aí, cheguei a conclusão de que cada um entendia de uma determinada maneira, motivo pelo qual os encaminhamentos eram em grande volume. Os termos problema, dificuldade e transtornos de aprendizagem se mesclavam nos encaminhamentos referindo-se às questões específicas de aprendizagem escolar, como se tudo fosse a mesma coisa!
No desenvolvimento da pesquisa, reuni o material disponível em termos das definições, (1994-1997) e lancei a minha definição de dificuldade de aprendizagem, que me atendia enquanto profissional, já que o que tinha encontrado me deixava mais confusa ainda!
Precisava partir de algum ponto – e o ponto foi a minha própria definição.
“ Dificuldade de aprendizagem é uma situação momentânea na vida do aluno, que não consegue caminhar em seus processos escolares, dentro do currículo “esperado” pela escola, acarretando comprometimento em termos de aproveitamento e/ou avaliação.”(HASHIMOTO, Cecília I. Mestrado. PUC/SP, 1997)
Na época, a banca mencionou que o trabalho era inédito e que deveria ter sido encaminhado como Doutorado, e não Mestrado. Mas, isso não aconteceu, nem nos ocorreu... e meu Doutorado veio muito tempo depois.
Organizei, também, um quadro do que me parecia ser o mais próximo de todo o material que encontrei sobre vários tipos de definições de dificuldades de aprendizagem de modo não só a esclarecer o que eram e são, como também quem é o responsável competente por trabalhar tais situações, onde que ocorre o trabalho, que medidas são compatíveis, etc.Categorizei por:
A) Profissional,: médico, especialista , professor/orientador;
B)Competência: distúrbio, problema, dificuldade;
C) Atuação: consultório e escola;
D) Medidas: exames clínicos e medicação, terapias específicas, metodologias e estratégias - recuperação do aluno,
Cruzei os dados e tive maior clareza do que estava tentando investigar.(Está disponível para consulta na Dissertação de Mestrado ou na publicação: O coordenador pedagógico e o espaço de mudança. São Paulo : Edições Loyola, 2001)
Agora, a pergunta que todos devem estar fazendo? Por que trazer um trabalho de 1994 aqui para discussão, neste momento, 2015?
Resolvi trazer este trabalho novamente à tona porque, passados 21 anos da publicação do mesmo, percebo que nada mudou.
A escola continua encaminhando para especialistas e/ou médicos as questões referentes às dificuldades de aprendizagem dos alunos, depositando nestes, a possível solução.
A concepção de dificuldade de aprendizagem que permeia a prática de professores e orientadores continua distorcida e merece reflexão.
Hoje tenho 32 anos de experiência na área da Educação, sou Psicopedagoga Clínica atuo em consultório próprio, trabalho em cursos de Pós-Graduação, sou palestrante e consultora e o que vejo é no mínimo, preocupante.
Não sei como fica para os demais profissionais da área mas o que recebo em consultório em termos de encaminhamentos, no trabalho com professores e no atendimento com de pais... as questões são as mesmas!
Há uma ignorância quanto à temática dificuldade de aprendizagem. E aqui nem estou entrando na discussão dos encaminhamentos que já vem com laudo da escola – que não é clínica e nem pode lançar diagnóstico, salvo se tiver profissional técnico competente para a função e ainda assim, há que se tomar todos os cuidados éticos!
Voltando ao desconhecimento das ações, dúvidas pairam no ar:
Quem deve dar conta? É dificuldade, problema ou distúrbio? Como trabalhar na escola? Qual é o profissional capacitado?
E ainda temos a discussão do que significa o reforço escolar! Reforçar o quê?
Como não se sabe.... a via de acesso mais rápida é o especialista.
E a escola perde muito com isso:
A)Perde por não trabalhar o aluno no ambiente que deve ser trabalhado, com recursos diversos que atendam as demandas;
B)Perde por não trabalhar o professor que precisa treinar o olhar, desenvolver a escuta tenta, se instrumentalizar;
C)Perde no todo, considerando que todo o problema deva ser resolvido fora do muro escolar;
D)Perde por não assumir sua parte nas ações, metodologias, didáticas e organização dos módulos e atividades;
E)Perde por não considerar que encaminhar muitas vezes não resolve, só traz mais sofrimento a criança;
F)Perde, enfim, por não acolher.
Vale pensar. Até que ponto a criança que vai para um encaminhamento externo para especialista, necessita deste?
Um grande abraço a todos.
Cecília
https://www.linkedin.com/pulse/dificuldades-de-aprendizagem-concep%C3%A7%C3%B5es-que-permeiam-e-hashimoto
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